Ishwara-Pranidhana
Ishvara pranidhana é o Niyama associado à nossa conexão e rendição ao Divino. Trata-se do esforço pessoal em oferecer o seu melhor, os seus atos, os seus pensamentos, as suas ações, toda a sua obra ao Divino e à humanidade, porque somos todos um. Ishvara pranidhana é honrar a Força Maior que nos mantém e está sempre presente, a todo momento em nossas vidas, a causa e a consequência de nossas vidas, o Tudo e o Todo, o Princípio e o Fim.
Īśvarapraṇidhāna é uma palavra em sânscrito composta por duas palavras īśvara (ईश्वर) e praṇidhāna (प्रणिधान).
Vśvara (às vezes escrito Īshvara) significa literalmente “dono do melhor, bonito”, “governante de escolhas, bênçãos, benefícios” ou “chefe do pretendente, amante”. A literatura religiosa posterior em sânscrito amplia a referência desse termo para se referir a Deus, o Brahman Absoluto, o Verdadeiro Eu ou a Realidade Imutável.
Praṇidhāna é usado para significar uma gama de sentidos, incluindo “imposição, fixação, aplicação, atenção (prestada a), meditação, desejo, oração”.
Īśvarapraṇidhāna significa, portanto, comprometer-se no que se faz com um Senhor, mas nos Yoga Sutras a referência não é a qualquer senhor, mas a Um especial (Puruṣa) o Primeiro Professor (Paramaguru) que é livre de todos os obstáculos e karmas.
A prática de Ishvara Pranidhana, portanto, significa: se formos capazes de entregar, completamente, nossas identidades individuais do ego para o Divino ( começando por nossa fagulha divina, nossa Luz Interior da Consciência), alcançaremos a identidade de Deus. Se pudermos dedicar nossas vidas a servir ao Maior, indo além de todos os sentimentos de separação. Se formos capazes de afirmar, verdadeiramente, do fundo do Coração: “Meu Deus e meu Senhor, o meu corpo, a minha mente e o meu coração estão à sua inteira disposição, para fazer o que o Senhor, em toda sua Plenitude e Graça, julgar melhor”, então seremos libertados do estresse, da ansiedade, da insegurança e do karma negativo que surge desta confiança equivocada e relativa em nossos falíveis egos para determinar quais ações tomamos em nossas vidas.
No aforismo 45 do capítulo II – Sadhana Pada dos Yoga Sutras de Patañjali está dito:
समाधि सिद्धिःीश्वरप्रणिधानात्
samādhi siddhiḥ-īśvarapraṇidhānāt
“Ao aceitar seu destino (ishvarapranidhana), você alcança o autoconhecimento (samadhi) e o poder sobrenatural (siddhi).”
Professor Hermógenes nos deixou uma frase que ficou bastante conhecida e simboliza muito bem o Ishwara-Pranidhana:
“Entrego, Confio, Aceito e Agradeço” [ Prof. Hermógenes]
E eu aqui, humildemente, ouso interpretar, à minha maneira, cada palavra, tão milimetricamente e cuidadosamente colocada pelo Professor nessa frase, ou melhor, nesse mantra.
Entrego tudo o que tenho, tudo o que sou, tudo o que fui e o que serei, tudo o que penso, tudo o que faço porque meu esforço é o de sempre fazer, com objetivo de entregar, sempre, o melhor a Ti, Senhor.
Confio que tudo o que me foi designado, o que me foi proporcionado, tem seu Divino propósito, e assim é feito graças a Ti, ó Senhor, para a minha melhor experiência, para o meu aprendizado, para a minha evolução
Aceito de bom grado todos os desafios e conquistas que me são colocados por Ti, ó Senhor, os fáceis e os difíceis, os prazerosos e os sofridos, porque sei que todos, à sua forma, têm o seu propósito e suas razões de existir
E Agradeço ,cada minuto, cada oportunidade, cada segundo da minha existência, desta e de tantas outras, porque sei, que ela somente é possível, graças a Ti, ó Senhor.
“E um velho sacerdote disse: Fale-nos sobre a Religião.
E ele respondeu:
Terei falado de outra coisa até agora?
Não será a religião senão todos os atos e toda a reflexão, e tudo aquilo que não é ato nem reflexão, mas o encantamento e a surpresa que sempre brotam na alma, mesmo enquanto as mãos talham a pedra ou trabalham no tear?
Quem poderá separar a sua fé de suas ações, ou suas crenças de suas ocupações?
Quem pode estender as suas horas diante de si, dizendo, “Estas são para Deus e estas são para mim: estas são para a minha alma e estas são para o meu corpo?”
Todas as suas horas são asas que voam no espaço de um eu para o outro eu.
Aquele que ostenta a sua moral como a sua melhor roupa, melhor faria se andasse nu.
O vento e o sol não abrirão feridas na sua pele.
E aquele que define sua conduta pela ética prende sua ave cantante em uma gaiola
Os cânticos mais livres não ecoam entre barras e grades
E aquele para quem a devoção é uma janela, que pode ser aberta, mas também fechada, ainda não visitou a morada da sua alma cujas janelas, sempre estão abertas, de aurora a aurora.
Seu dia a dia é seu templo e a sua religião.
Cada vez que entrar nele, entrai por inteiro.
Levai o arado, a forja, a marreta e a lira
As coisas que precisar por necessidade ou prazer.
Pois, em sonhos não podereis erguer-vos acima dos vossos feitos, nem cair mais baixo do que as vossas falhas.
E leve com você todos os homens, pois em adoração não poderá voar mais alto do que as suas esperanças, nem humilhar-se abaixo de seu desespero.
E se quer conhecer Deus, não perca tempo resolvendo enigmas.
Pelo contrário, olhe à sua volta e veja-Ô brincando com seus filhos.
E olhe para o horizonte e O verá caminhando sobre as nuvens, brilhando de braços abertos em um relâmpago, e descendo sobre a chuva.
Verá Deus sorrindo entre as flores, e depois erguendo-se para acenar-lhe nas árvores.” [Khalil Gibran, “O Profeta”]
O humano é falível. O ego, a alma individualizada nesta existência, na dualidade, facilmente se identifica e se apega com coisas falíveis. A separação, a perda, o medo da separação e da perda, são as causas do sofrimento, da ansiedade, da raiva, do desespero. Ishwara-Pranidhana é o apegar-se Àquele que não falha, ao Eterno. Este é o único apego onde não existe decepção, separação ou perda. Ao contrário é o Caminho para Samadhi, para a Autorrealização.
“Quem está em harmonia com o Tao é como um recém nascido. Não será picado por serpentes venenosas, os animais ferozes não o atacarão. As aves de rapina não se lançarão sobre ele. Seus ossos são frágeis, seus tendões são ternos, mas seu agarrar é poderoso. Nada sabe ainda sobre a união de homem e mulher. E mesmo assim o seu sangue se agita porque tem a plenitude da semente. Ele pode gritar o dia todo, entretanto jamais ficar rouco, porque ele tem a plenitude da Paz. Conhecer a Paz é ser eterno. Conhecer a eternidade é ser harmônico. Propagar a vida chama-se felicidade. O poder do sábio é assim, Ele permite que todas as coisas venham e vão, sem esforço, sem desejos. Ele nunca espera resultados; por isso nunca é desapontado. Ele nunca está desapontado; por isso seu espírito nunca envelhece.” [Tao Te Ching, cap 55]
Hoje vimos o último dos Niyamas. Na próxima oportunidade seguiremos nossa investigação do caminho óctuplo, Ashtanga, desta vez dedicando-nos ao entendimento do propósito dos Ásanas (posturas).
Até a próxima!! 🙂